AS VEZES PERGUNTAM-ME PORQUE INVISTO TANTO TEMPO E DINHEIRO FALANDO DE AMABILIDADE PARA COM OS ANIMAIS, QUANDO EXISTE TANTA CRUELDADE ENTRE OS HOMENS...AO QUE EU RESPONDO : ESTOU A TRABALHAR NAS RAÍZES ! (GEORGE T. ANGELL)

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

TESTAMENTO DE MENDIGO

Agora no fim da vida, como mendigo que sou, me sinto preocupado, intrigado e num momento me pergunto, embaraçado, se faço ou não testamento.
Não tendo, como não tenho e nunca tive ninguém,
Pra quem é que eu vou deixar tudo o que eu tenho : Os meus bens ?
Pra quem é que eu vou deixar, se fizer um testamento :

- minhas calças remendadas, o meu céu, minhas estrelas
 que não me canso de vê-las, quando ao relento deitado, deixo o olhar perdido distante no firmamento ?

- minha camisa rasgada, as águas dos rios, dos lagos, águas correntes, paradas, onde ás vezes tomo banho ?

- os vaga-lumes que em rebanhos, cercam o meu corpo de noite quando o verão é chegado ?

- mendigo assim como sou, pra quem vou deixar todo o ouro que me dá o sol que vejo nascer quando
  acordo na alvorada ? O sol que seca o meu corpo que o orvalho da madrugada com sua carícia molhou ?

- os meus bandos  de pardais, que ao entardecer nas arvores, brincando de esconde-esconde procuram se
  divertir ?

- pra quem vou deixar estas folhas de jornais que uso para me cobrir ?

- meu chapeu todo amassado,onde escuto o tilintar das moedas que me dão, os que tem a alma boa, os
  que tem bom coração ?

- e antes que a vida me largue, pra quem é que eu vou deixar o grande estoque que tenho de palavras
  "Deus lhe pague ?"

- todas as folhas de outono trazidas pelo vento, que vem meus pés atapetar ?

- minhas sandálias furadas que pisaram mil caminhos, cheias de pó das estradas. Estradas por onde andei
  em andanças vagabundas ?

- Pra quem é que eu vou deixar minhas saudades profundas, dos sonhos que não sonhei ?

- Os bancos dos meus jardins, onde durmo e acordo entre rosas e jasmins ?

- todos os raios de luar que beijam minhas mãos, quando num canto de rua eu as ergo em oração ?

- meu cajado e meu farnel e a marca deste beijo que uma criança deixou em meu rosto, perguntando se
  eu era  papai noel ?

- e este pedaço de trapo que no lixo eu encontrei, que transformei em lenço, para enxugar minhas lágrimas
  quando fingi que chorei ?

- se eu fizer um testamento......Testamento não farei ! sem nenhum papel passado, que papéis eu não ligo,
   agora estou resolvido : o que tenho deixarei, na situação em que estou, pra outro mendigo.
   Rogando a Deus que o faça, depois que eu tiver morrido, ser tão feliz quanto eu sou .

Urbano Reis
(transcrito da revista "Universo Espírita" n.04, p.15,Ed.hmp.)
Ele não tinha nada material para transmitir a alguém, mas sentiu-se feliz em deixar muitas coisas que o
dinheiro não compra.

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